CABARÉ DAS DONZELAS INOCENTES....assistam....CCBB

Minha curiosidade me torna um pouco prepotente. Quem sou eu para criticar ou resenhar uma obra de Sérgio Maggio? Pois é, eu fiz...mostrei a ele, e ele, de extrema gentileza pediu-me que publicasse no meu Blog. Fiquei hiper feliz... nada mais justo o coerente falar dessas mulheres que acima de tudo, são mulheres...

Sou até suspeita em relatar esta peça, já que sou fã de carteirinha do Sérgio. Eu só não sou só sua fã, como participo de tudo que ele produz, e claro, que antes da estréia desta peça, eu há muito já havia lido o livro. Quanto à dramaturgia, foi o tipo espetáculo fiel ao texto, coisa que embora, na contemporaneidade já não se use muito, seguiu o modelo padrão: texto x encenação. É um texto moderno referente a uma pesquisa de onze anos deste jornalista, que primeiro virou livro, depois peça teatral, talvez por retratar a atualidade tenha sido tão bem aproveitado o texto escrito.
O espaço escolhido para a apresentação também não poderia ter sido melhor, no Centro Cultural do Banco do Brasil, uma luzinha vermelha indicava a entrada de um túnel, desembocando num espaço onde era o próprio cabaré. A platéia também interage antes do início do espetáculo, participa dele. Os lugares são compostos de cadeiras, sofás e pufes.
Quanto às atuações, todas bem sintetizadas e claramente adequadas ao papel. Conta a história de quatro prostitutas decadentes, cada uma com suas lembranças, desejos e paixões. Seguem a vida, e mesmo com diferentes acontecimentos, o rumo de todas parece entrelaçar-se. A primeira história é de China, a dona do puteiro, mãe de duas filhas que querem tirá-la da vida, mas não conseguem convencer a matriarca. A excelente interpretação da atriz mostra claramente a ligação da vida discriminada com a opção de ser puta. Ela gosta de ser puta, ela quer ser puta, foi assim que cresceu e assim quer morrer, porém, a atuação transforma o texto em poesia, faz-nos refletir o quanto essa profissão é antiga e o quanto ainda é marginalizada. Outra indiscutível atuação é a de Saiana, a mulher do facão de baixo do travesseiro. Mulher que já teve muito dinheiro, ajudou a família e por ter temperamento impulsivo, acabou perdendo tudo e foi acalentar-se no cabaré de China. É a puta mais convicta de todas. Ela conseguiu através de gestos, movimentos, ações físicas, transformar coisas banais como se auto-definir “putas” em algo engraçado e até mesmo carismático, manteve o público atento, mesmo porque seu tom de voz era um tanto quanto mais alto que as demais. Era a mulher do facão. Já a Menininha, como a proposta supunha, e acredito que o texto retratou de fato a verdadeira Menininha, doce, singela, carinha de criança e obstinada por uma paixão que foi embora, outra mulher, a Cristina. A utilização de trejeitos infantis, junto com essa doença, essa lembrança dolorida que corroem suas veias, fez desta personagem outra fiel adaptação à obra. Ela consegue, através de sentimentos de pena e irritação, alertar o público sobre seu sofrimento em amar outra mulher, o que também nos faz rever a questão social da mulher hoje na nossa sociedade. Até onde ela é livre para fazer suas escolhas? E a última, Cabeluda, era a mais “cabeluda de todas”, como o próprio apelido propõe. Era de fato uma bêbada verdadeira. Consegui dentro dos eu papel decadente de alcoólatra , desenvolver uma linha racional e emotiva contando sua história de abuso sexual na infância. Desenvolve intensamente com trejeitos e uma alma morta viva e de porre, conquistar a platéia com sua excelente atuação. É verídica É emociante. É real.
Todas se integraram intensamente, todas no conjunto formaram um quádruplo indiscutível em suas atuações, uma fazia parte da outra, e uma não existia sem a outra. O espetáculo, para os mais conservadores é um bombardeio de palavrões, o que não importa nem um pouco para elas, pois retrata o meio em que vivem. Certamente, nos faz pensar na condição da mulher, do quanto ainda somos preconceituosos, e ao mesmo tempo o quanto nos sensibilizamos com as questões colocadas em cena. É a mulher prostituta, meretriz, cafetina, puta, mas antes de tudo isso, mulher.
Uma coisa que não absorvi muito bem foi o fato de uma delas falar que ser puta era um estigma. Será? Será que o que discriminamos podemos dar como “estigma”, não sei? Ainda estou digerindo essa frase.
Parabéns Sérgio Maggio, tudo foi muito envolvente, criativo e fidedigno ao seu texto.

Comentários

RX154283 disse…
Massa Débora! Digno de coluna em jornal! Parabéns!
Jones Schneider disse…
Débora, muito bacana seu exercício crítico aqui no blog, você realmente instiga em tempos do sumiço da crítica no jornal. Obrigado

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